Há uma epidemia de imbecilidade. A praga está por todos os cantos. Sua esposa, a arrogância, não larga a mão da parceira em hipótese alguma. Especialistas falam em mutualismo das (des)virtudes.
Por não frequentar as redes sociais passo um bom tempo distante de idiotas. Ao menos dos sintomáticos. Por vezes os encontro nas barbearias, reuniões familiares e demais oportunidades que o acaso nos proporciona. Porém, no mundo real, são animais amansados.
Quando não fazem o papel de papagaio, repetindo bravatas vistas na internet, reproduzem opiniões esdrúxulas com convicção, que rapidamente se dissolvem em outro assunto fútil, já que não há profundidade ou domínio técnico para sustentar uma discussão por muito tempo.
No meio digital, a banda toca numa cadência mais agressiva. No passado, falávamos sobre a proteção que os perfis falsos e o anonimato das redes proporcionavam aos haters, gerando um ambiente confortável para os ataques virtuais. Hoje, não há mais vergonha. Por inocência ou despreocupação, a maioria dos idiotas põem a cara a tapa. Com fotos, nome real e informações manualmente inseridas nos perfis, ostentam usuários para chamar de seus.
Antes era preciso certo trabalho para encontrá-los. Viviam escondidos em páginas específicas, fechados em suas bolhas. Às vezes marcavam presença em publicações pontuais, via ataques coordenados ou virais fora de controle. Com os demoníacos vídeos curtos e do aumento do tempo de tela, eles estão por toda parte.
Um amigo me mostrou um vídeo engraçado que apareceu em seu feed. Cometi o mortal pecado de abrir os comentários. Saí horrorizado. A quantidade e a intensidade de absurdos me ferveram o sangue. Não pude acreditar que um vídeo tão inocente atraiu tantos donos da verdade, bravateiros e templários morais.
Decidi fazer uma breve expedição às redes. Logo diagnostiquei se tratar de um problema crônico. A digitalização dos meios de comunicação e o ambiente bélico instaurado no ciberespaço potencializaram o fenômeno observado, mas a raiz do mal reside fora das telas. A imbecilidade, umbilicalmente ligada à arrogância, é apenas pronunciada digitalmente. Seu embrião é real, humano e cotidiano.
O imbecil é, antes de tudo, um arrogante. Tem o rei na barriga, sua verdade na cabeça e não admite ser contrariado. Quer sobrepor sua verdade à do outro, que considera um burro, limitado, alienado, manipulado. Apenas ele e os seus sabem das verdades. Quando decide opinar sobre algo (e como opinam!), o imbecil é convicto. Usa caixa alta, para enfatizar sua imbecilidade, como quem grita para ser ouvido.
Em geral, são autoritários. Dizem gostar de serem “respeitados”, como era antigamente. Ah, o passado! Boa parte deles são saudosistas. Sentem falta dos bons tempos, da boa geração, da sua época que era boa! Agora nada presta. E culpam a Anitta, a Globo e a internet —a mesma que usam para ter chiliques.
Em sua arrogância, ele se acha inteligente. Bem informado. Sabe de tudo, antes de todos, mais que todo mundo e entende melhor do que você. Quer saber de algo? Pergunte ao imbecil. Ele te contará o que não sabes sobre. É quase um agente especial.
Lamentavelmente, as notícias não são boas. A epidemia tende a se agravar, especialmente pela alta taxa de contágio. Porém, a mortalidade não é alta. A expectativa de vida dos imbecis não deve reduzir, a menos que pratiquem automedicação ou algo do gênero. Como os inocentes do Leblon, os imbecis tudo ignoram e esquecem.
Luís Otávio Alves Maia é estudante e vive em Sete Lagoas (MG).
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Fonte ==> Folha SP