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Seu filho já falou sobre homem ‘sigma’? Nova moda entre meninos tem ligação com ‘Adolescência’

Seu filho já falou sobre homem ‘sigma’? Nova moda entre meninos tem ligação com ‘Adolescência’

Seu filho está usando termos e emojis que parecem estar ligados à masculinidade violenta da série Adolescência, da Netflix? Já ouviu ele falar sobre um homem “sigma”? Calma, a ideia aqui não é apavorar ninguém.

Até crianças que não têm perfis em redes sociais começaram a mencionar os tais “sigma”. Os conceitos e as origens nunca são muito precisos, mas, em geral, sigma é visto como um adjetivo elogioso para um homem.

Os atores Stephen Graham e Owen Cooper, pai e filho na minissérie ‘Adolescência’, da Netflix Foto: Netflix/Divulgação

Há uma enxurrada de vídeos curtos no YouTube e Tik Tok, onde o termo se popularizou há um tempo, tentando explicar o novo significado para o que era antes só uma letra do alfabeto grego. Eles são ilustrados com fotos de famosos, como os atores Cillian Murphy (de Oppenheimer) e Keanu Reeves (Matrix) ou o jogador Cristiano Ronaldo, entre outros.

A ideia central seria de um homem autosuficiente, “um lobo solitário”, misterioso porque “fala pouco”, elegante, que não se importa com a opinião dos outros e não demonstra emoções. “Busque parecer confortável, não é para ser o palhaço da sala, use o bom humor a seu favor, seja confiante”, diz o texto em um dos vídeos, com milhões de curtidas.

Sobre as mulheres, as redes sociais dizem que os sigmas “não correm atrás” e “nunca as colocam em pedestais”, “as tratam com respeito, mas não deixam que elas os controle”.

Por mais que não haja na superfície qualquer sugestão de violência contra a mulher, está óbvio o padrão de masculinidade que esses vídeos valorizam. Seria um “homem não chora” atual, com algo a mais.

Há ainda os emojis como o de um copo de vinho e a cara de pedra, um desenho da máscara Moai, da Ilha de Páscoa. Essa última virou sinônimo de masculinidade para grupos extremistas que acreditam que só um tipo de aparência física atrai as mulheres, como o maxilar reto, assim como a máscara, algo abordado na série Adolescência também.

Símbolos de taça de vinho e de estátua moai são compartilhados em fóruns que exaltam o homem sigma Foto: Reprodução

Mas muitos meninos hoje sequer entendem de onde vem isso tudo ou conhecem a ligação desses símbolos com comunidades violentas de ataque a mulheres. São como gírias da moda e a necessidade de pertencimento faz todo mundo entrar na onda sigma. Para muitos adolescentes, é como aqueles chinelos com meia, todo mundo usa.

De qualquer forma, na adolescência eles estão construindo sua identidade e, ao ter contato com ideias como essas sem uma mediação que os faça refletir, podem começar a vê-las como naturais. E assumir valores deturpados sobre relações, poder e afeto. Em alguns casos vai levar, sim, a comportamentos misóginos e a uma masculinidade violenta, bem retratados em Adolescência.

A questão é: por que essa ideia sigma tem tanto apelo com os meninos?

Talvez porque ela traga um sentimento de orgulho de ser homem, que eles não conseguem sequer alcançar em outras relações, nas suas famílias, com seus amigos, com professores.

Metade dos lares brasileiros tem apenas um dos responsáveis pelas crianças – na maioria, a mãe. Outros milhões de meninos sequer têm o pai na certidão de nascimento. E, mesmo com a figura masculina fisicamente presente, são raros os casos dos pais dispostos a fazer seus filhos se orgulharem de serem homens por motivos que não sejam a força, a liderança e o controle.

Quase sempre, a tomada de consciência é só das mulheres. Em casa, nas escolas, se discute muito o que é ser mulher hoje e não o que ser homem.

Um homem orgulhoso de ser homem porque cuida dos filhos e dos pais, que demonstra emoções além da explosão quando está bravo, tem medos e dúvidas, confessa fraquezas, compartilha tarefas e carga mental nas famílias. Fala de sexo com seu filho que fatalmente já acessou pornografia pesada online. E não só pergunta como foi o jogo de futebol e as notas da escola.

Não adianta apenas rejeitar a geração anterior, que batia de cinta e não lavava louça. É preciso muito mais para vencer o apelo dos vídeos sigma do Tik Tok.

Se os pais, professores e outros homens adultos de referência não olharem para a sua própria masculinidade e perceberem os padrões que não deviam passar adiante, serão as redes que vão ensinar o que é ser macho para os meninos. Mães e professoras fazem muito, claro, e a parceria é essencial com elas. Mas não é à toa que Adolescência é tanto sobre o pai de Jamie.



Fonte ==> Estadão

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