Enquanto o mundo enfrenta ondas de calor, enchentes devastadoras e incêndios florestais sem precedentes, o Brasil continua patinando na implementação de políticas ambientais eficazes. Pior: vem retrocedendo em uma pauta que já foi muito mais robusta em nosso país. Apesar do conhecimento técnico acumulado e de uma legislação ambiental que se aprimorou ao longo dos anos, três obstáculos estruturais perpetuam a crise que vivemos: a descontinuidade das políticas, a falta de transversalidade entre órgãos governamentais e a burocracia letárgica diante da emergência climática.
O primeiro e mais grave desafio é a transformação das políticas ambientais em medidas de governo, em vez de políticas de Estado. A cada mudança de gestão, assistimos ao abandono de planos estratégicos, como se a “ruptura” fosse uma virtude. O exemplo mais recente é o projeto de lei aprovado pelo Senado que flexibiliza o licenciamento ambiental, isentando atividades como agropecuária e obras de infraestrutura, colocando em risco ecossistemas e comunidades tradicionais.
O segundo problema é a falta de transversalidade. A crise ambiental não respeita fronteiras administrativas: afeta saúde, mobilidade, habitação e educação simultaneamente. No entanto, ministérios e secretarias estaduais e municipais continuam operando como ilhas, sem diálogo efetivo. A pauta ambiental é, por definição, transversal, mas as estruturas de governo insistem em tratá-la como assunto setorial.
O terceiro desafio é a morosidade do Estado diante de uma crise que exige ações imediatas. Enquanto cientistas alertam que temos menos de uma década para evitar os piores efeitos do aquecimento global, o Brasil continua se movendo com a velocidade de um navio cargueiro. Licenças ambientais são emitidas sem os devidos cuidados, projetos de lei essenciais ficam anos tramitando e planos de adaptação climática sequer saem do papel.
Esses problemas se agravam com o constante rebaixamento orçamentário das pastas ambientais. Em 2025, o Ministério do Meio Ambiente recebeu apenas R$ 3,72 bilhões, enquanto a Defesa ficou com mais de R$ 120 bilhões. Essa disparidade revela um modelo de desenvolvimento ultrapassado, que trata a crise ecológica como questão secundária.
Para romper esse ciclo, três medidas são urgentes: institucionalizar as políticas ambientais, tornando-as menos vulneráveis às mudanças de governo; criar mecanismos de integração entre as diversas esferas governamentais, com metas compartilhadas e orçamentos conjuntos; e estabelecer prazos curtos e vinculantes para decisões sobre licenciamentos e planos de adaptação climática.
A crise ambiental não espera. Enquanto discutimos procedimentos, o planeta continua esquentando, os rios secando e as florestas desaparecendo. Ou transformamos nossa maneira de fazer política ambiental, ou seremos lembrados como a geração que tinha todo o conhecimento para agir, mas preferiu procrastinar.
É hora de repensar o crescimento econômico, substituindo o desenvolvimento predatório por um modelo que respeite os limites da natureza. Parar para pensar pode ser o maior gesto de coragem. O momento de agir é agora — com continuidade, integração e urgência.
Fonte ==> Folha SP – TEC