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Onde é a árvore mais próxima da sua casa? – 02/07/2025 – Ciência Fundamental

A imagem apresenta um cenário urbano com prédios ao fundo e uma vegetação densa à frente. Há várias árvores e plantas estilizadas, com um personagem vestido de amarelo caminhando por um caminho entre a vegetação. O fundo é composto por edifícios com janelas e varandas, e a paleta de cores é predominantemente em tons de marrom, verde e amarelo.

Em um domingo à tarde, cometi o erro de entrar no WhatsApp do condomínio. Moradores de fora do bairro haviam levado crianças para brincar na praça em frente ao edifício, e o grupo discutia a esse respeito. Alguns esbravejavam: tais crianças, que provavelmente têm outras opções de diversão, assustam e inibem as que moram no bairro. Outros argumentavam o óbvio —que a praça é pública e, portanto, deve ser compartilhada por todos.

Como cientista, trabalho com evidências e, portanto, resolvi espiar pela janela para constatar a gravidade da situação. Assim que bati o olho nos visitantes, percebi do que se tratava: racismo ambiental. A maioria das crianças e pais que buscavam ali uma atividade de lazer eram pretos ou pardos.

Racismo ambiental significa que as disparidades sociais também afetam o acesso ao meio ambiente. Se existe uma árvore na sua rua, sinta-se privilegiado: o último censo do IBGE revelou que um terço da população urbana vive em ruas onde não há nenhuma árvore. Ou seja, no país, cerca de 58,7 milhões de pessoas não têm acesso pleno aos benefícios promovidos pela vegetação urbana.

Esses benefícios, chamados serviços ecossistêmicos, são como presentes que a natureza nos fornece direta ou indiretamente. Quando respiramos, por exemplo, usufruímos do oxigênio produzido pela vegetação. As áreas verdes também sequestram e estocam gases do efeito estufa (GEE), que intensificam as mudanças climáticas globais. Logo, uma população com mais acesso à vegetação tende a respirar um ar de qualidade e, consequentemente, apresenta melhores condições de saúde e bem-estar.

Outros serviços ecossistêmicos fornecidos pela vegetação envolvem a reposição das fontes de água, a provisão de sombras e a produção de alimentos como frutas e verduras. E ainda existem aqueles que contribuem para a saúde mental. A prática de esportes ao ar livre, a realização de um piquenique e atividades de ecoturismo são exemplos de serviços ecossistêmicos culturais, aqueles que são imateriais.

Durante a pandemia de Covid-19, o grupo liderado pela pesquisadora Sarai Pouso, da Universidade do País Basco, demonstrou que pessoas que tiveram acesso a espaços verdes urbanos apresentaram menos sintomas ligados à depressão e ansiedade. Os efeitos positivos se estenderam até para quem não saiu de casa, mas pôde ver uma árvore pela janela.

No entanto, existe uma tendência mundial que correlaciona maior acesso a áreas verdes urbanas a populações com maior poder aquisitivo e maior escolaridade. Populações pretas e pardas, historicamente menos privilegiadas, têm menor acesso a essas áreas, equiparadas a itens de luxo.

Embora todos necessitem dos proveitos gerados pela vegetação, há uma lacuna justamente onde eles são mais necessários. Pessoas com menor acesso a áreas verdes, geralmente a população com renda mais baixa, estão mais expostas a fatores de risco para doenças cardiorrespiratórias. Como muitas dependem do SUS, essa situação contribui para a sobrecarga da rede pública de saúde.

Essa problemática pode se agravar: a ONU projeta que, até 2050, 70% da população mundial viverá em cidades, espaços já afetados por tragédias climáticas, pela especulação imobiliária e pelo consequente afastamento de grupos sub-representados para as periferias.

Em um país marcado por desigualdades históricas, o acesso pleno a áreas verdes ainda é um privilégio reservado a poucos. São necessárias políticas públicas informadas e a colaboração dos diversos setores da sociedade, em especial diante dos cenários de mudanças climáticas, para que os benefícios da natureza não sejam sempre colhidos pelas mesmas pessoas e para que as sementes da justiça ambiental possam, enfim, germinar no concreto.

O blog Ciência Fundamental é editado pelo Serrapilheira, um instituto privado, sem fins lucrativos, de apoio à ciência no Brasil. Inscreva-se na newsletter do Serrapilheira para acompanhar as novidades do instituto e do blog.



Fonte ==> Folha SP – TEC

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