No julgamento de Jair Bolsonaro não há “…aquele clima de Copa do Mundo a que nos acostumamos na política nacional, com cada cidadão vestindo as cores de um time, torcendo pelo resultado que lhe interessa”, escreveu o professor Wilson Gomes, colunista desta Folha.
Para as torcidas, o resultado estaria dado. Os adeptos dos condenados mais pensam em “tentar virar o resultado em outro lugar: o tapetão da anistia”.
É verdade. Mas, além disso, é razoável especular se vai haver também briga fora estádio, depredação da sede dos jogos, mudança do quadro de arbitragem ou, no limite, a decretação de que não vai haver mais jogo ou juiz. A torcida desanimada da democracia não pensa muito no pós-jogo.
A insurreição permanente do bolsonarismo vai perder força e apoios? Parte das elites políticas e econômicas diz que a apoia na circunstância, por pragmatismo, para derrotar o lulismo-petismo e inaugurar a Ponte para o Futuro (liberal) 2.
Com tal vitória do partido do reformismo pacificador, o PRP, por assim dizer, lulistas-petistas e bolsonaristas seriam jogados da ponte ao mar do esquecimento. Outra parte das elites é golpista mesmo ou, se não tem tu (“reformas e pacificação”), vai tu mesmo (depreda a democracia).
Esse pouso suave no mundo encantado da democracia “pacificada”, depois de 14 anos de turbulência (2013-2026), é um conto especulativo de fadas políticas, sociais e econômicas. Depois do jogo, do julgamento, há risco de quebra-quebra.
O governo de Donald Trump diz neste começo de semana tanto que não há mais sanções contra o Brasil no gatilho como que vai continuar a “tomar as medidas cabíveis”.
Eduardo Bolsonaro terá ainda ajuda para depredar instituições democráticas e a economia? Gente e grupos com poder vão ficar de que lado se vierem sanções ainda mais graves, como as financeiras? Que tipo de retaliação o Congresso de direita vai tentar contra o governo Lula, união de bolsonaristas fulos com oposição eleitoral?
No “tapetão”, na votação da anistia, ainda não é possível saber se vai vencer o PRP, o partido do “reformismo pacificador”, o acordão conservador de quase sempre, ou a liderança da insurreição golpista, apoiada por Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo.
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Suponha-se que vença o PRP. O que vai ser dos motivos e da base bolsonarista? É um movimento popular, organizado e enraizado nas redes, com insatisfações e desejos muito reais, entre eles a limitação de direitos.
As lideranças do movimento serão agraciadas com algum indulto em 2027 (com risco de crise institucional)? Mesmo que não seja assim, para onde vão essa fúria da massa insatisfeita e os partidos informais que conseguiram mais poder político de fato sob Jair Bolsonaro, como parte do agro, o evangelismo político de direita, o novo empresariado sem indiferentes à democracia e mesmo os militares?
O que será da massa do centrão-direitão que domina de prefeituras ao Congresso? Farão parte do novo arranjo de início tolerante da democracia? Vão tentar alterar o sistema político, implantando de fato um parlamentarismo corporativo conservador ou reacionário?
“De início”: uma crise pode reanimar o golpismo. Será difícil administrar a economia a partir de 2027. Haverá concertação para acabar paulatinamente com as regras do jogo ou com os jogos? Afinal, um projeto bolsonarista é ganhar maioria no Senado de modo a controlar o STF.
A história do golpismo não acaba com o julgamento “histórico”.
Fonte ==> Folha SP