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Máquinas podem pensar como nós? – 16/09/2025 – Marcelo Viana

Um homem em uma camisa preta está prestes a cumprimentar um robô humanoide que se encontra à sua frente. O robô possui um design moderno, com uma cabeça preta e corpo prateado. O ambiente é iluminado e há portas de vidro ao fundo, com outras pessoas visíveis ao longe.

Essa questão filosófica é muito mais antiga do que o computador eletrônico. O primeiro passo para trazer o problema para o domínio da ciência experimental veio do matemático inglês Alan Turing (1912–1954), pioneiro da computação.

Em 1950, Turing propôs o seguinte teste da capacidade de uma máquina para exibir comportamento indistinguível do de um ser humano. Um interrogador humano comunica por escrito com dois participantes, uma máquina e uma pessoa, que estão ocultos. O objetivo do interrogador é identificar qual é qual, a partir das respostas dos participantes. Se não conseguir a máquina passa no teste.

Em três quartos de século os avanços nessa área foram espetaculares, e as melhores inteligências artificiais de que dispomos hoje provavelmente passam no teste tal como Turing o concebeu.

Ainda assim, a maioria de nós concordaria que ChatGPT, DeepSeek, Gemini e seus pares não “pensam” no sentido humano (o que quer que isso signifique…). Passar no teste de Turing não significa que a máquina tenha consciência de si mesma ou capacidade cognitiva, apenas que ela disfarça bem.

No livro “The Emperor’s New Mind”, o físico inglês Roger Penrose (n. 1931), prêmio Nobel de física em 2020, defende com veemência que a inteligência humana é fundamentalmente distinta da ação de qualquer computador, não importa quão poderoso ele seja. O título é uma paródia de “The emperor’s new clothes”, que é como é chamado em inglês o conto infantil “O rei está nu”, trocando “clothes” (roupa) por “mind” (mente).

Segundo Penrose, a maioria conformista aceita a chamada teoria forte da IA —que um algoritmo computacional suficientemente complexo pode alcançar a consciência de si mesmo—, mas quem olha de modo descompromissado, como uma criança, vê que essa teoria não se sustenta.

Ao mesmo tempo, com a autoridade de um dos maiores cientistas dos nossos tempos, ele expressa a esperança de que a matemática, em toda a sua plenitude, trará avanços profundos na compreensão da mente humana: “Há tanto mistério e beleza quanto se queira no mundo platônico da matemática, e muito desse mistério está fora da parte relativamente limitada em que residem os algoritmos e a computação”.

Entre os defensores da teoria forte da IA apontados por Penrose está Douglas Hofstadter, autor do monumental “Gödel, Escher, Bach”, um dos livros mais incríveis que eu já li. GEB, como é conhecido pelos fãs, é uma vasta exploração de temas comuns às obras do lógico e matemático austríaco Kurt Gödel (1906–1978), do artista gráfico holandês Maurits Cornelis Escher (1898–1972) e do compositor e músico alemão Johann Sebastian Bach (1685–1750), tendo como objetivo maior entender como a cognição e a consciência emergem em nossos cérebros.

Hofstadter observa que sistemas complexos desenvolvem funções e características que não fazem sentido para suas partes. O cérebro, por exemplo, está formado por neurônios, que são células extraordinárias, mas certamente não pensam. Então, o que na estrutura do cérebro faculta a formação de ideias e sentimentos? GEB destaca duas propriedades cruciais —autorreferência e “loops” estranhos—, identificando essas mesmas noções nos teoremas de Gödel, nas gravuras de Escher e nas composições de Bach. Explico na semana que vem.



Fonte ==> Folha SP – TEC

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