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A inseminação artificial caseira deve ser regulamentada? SIM – 07/03/2025 – Opinião

A inseminação artificial caseira deve ser regulamentada? SIM - 07/03/2025 - Opinião

Graças aos avanços da engenharia genética, o sonho de ter filhos tornou-se uma realidade ao alcance de qualquer pessoa. No entanto, o uso das técnicas de reprodução assistida, não.

Essas práticas se encontram regulamentadas exclusivamente pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), por meio de normas éticas que se destinam à relação médico-paciente. Porém, ultrapassam esse limite ao impor, por exemplo, o anonimato do doador e proibir a remuneração nas hipóteses de gravidez por substituição, chamada de “barriga de aluguel”.

Um dos protocolos exigidos é que os envolvidos no processo procriativo e o diretor da clínica médica firmem um termo de consentimento informado. Tal exigência acabou induzindo em erro o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que exige a apresentação desse documento para o registro extrajudicial do recém-nascido.

Mas existe uma realidade que não se pode ignorar.

Quer os altos custos do procedimento nas clínicas de fertilização, quer o desejo de escolher o doador do material genético, difundiu-se a prática da autoinseminação, chamada de “inseminação caseira”, principalmente entre os casais homoafetivos femininos. No mais das vezes, elas querem que o filho conheça e conviva com quem elegeram para genitor.

Só que, quando do nascimento do filho, pela ausência do indigitado documento, o registrador civil limita-se a promover o registro no nome da parturiente. Mesmo quando consta o nome da outra mãe na Declaração de Nascido Vivo (DNV) ou mesmo quando elas são casadas.

A negativa impõe a propositura de uma ação judicial para a inclusão do nome da mãe não gestante no registro. Durante esse período —que costuma ser longo—, ela resta privada de gozar da licença-maternidade e de receber o salário-maternidade. Já o filho tem cerceado o direito à própria identidade, de ter o nome de uma das mães em seu registro de nascimento. Não poder ser incluído no seu plano de saúde, não fará jus à herança caso ela venha a falecer. E, na hipótese de as mães se separarem, não terá direito à convivência nem a alimentos.

Ora, se o propósito da negativa é garantir que não ocorram fraudes, cabe é delegar ao oficial do registro civil que promova o registro após colher as provas que entenda necessárias para certificar-se da origem da filiação. Até porque, em juízo, nem partes nem testemunhas são ouvidas. Limita-se o juiz a ouvir o Ministério Público e chancelar o pedido.

A injustificável resistência do CFM nada mais significa do que uma tentativa de assegurar reserva de mercado aos médicos, quando deveria editar normas que assegurem segurança a esse procedimento. Afinal, se existem potenciais riscos à mãe, maiores são os prejuízos ao filho.

Segundo o Superior Tribunal de Justiça, não há, no ordenamento brasileiro, vedação explícita ao registro de filiação realizada por meio de inseminação artificial “caseira”. Ao contrário, à luz dos princípios que norteiam o livre planejamento familiar e o melhor interesse da criança, indicam que a inseminação artificial “caseira” é protegida pelo ordenamento jurídico (recurso especial 2.137.415/SP, relatora Nancy Andrighi, j. 15/10/2024).

Diante desse panorama, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) protocolou perante o CNJ solicitação para que a norma reguladora dos serviços notariais e registrais assegure o duplo registro quando do nascimento, com as cautelas a serem adotadas pelo registrador.

Afinal, é imprescindível priorizar o interesse de quem goza, constitucionalmente, de proteção absoluta.

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Fonte ==> Folha SP

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