No final do ano passado, a empresa de pesquisa Tourism Economics previu um crescimento de 9% no turismo estrangeiro nos Estados Unidos. Em fevereiro, a previsão foi corrigida para uma queda de 5,1%, e há sinais de que o segundo prognóstico é otimista.
Uma tempestade perfeita de guerra comercial, detenções de viajantes com visto regular e ameaças de anexar territórios soberanos está provocando cancelamentos em massa nos planos de turismo de estrangeiros. Os chineses estão optando pela Austrália. Os europeus, ocupados em boicotar produtos americanos, já estão se afastando dos EUA, com a primeira queda no número de chegadas registrada em fevereiro.
Mas são os canadenses que puxaram a fila do boicote comercial e turístico, depois que Donald Trump passou a chamar seu país de 51º estado americano e a se referir ao agora ex-premiê Justin Trudeau como governador.
O Canadá cria mais empregos para americanos na indústria de turismo do que qualquer outro país. No ano passado, cidadãos do Canadá fizeram mais de 20 milhões de visitas aos EUA. E, devido ao rigor do inverno canadense, março é um mês em que as famílias aproveitam uma semana de férias escolares para fugir para temperaturas amenas de estados como a Flórida. A queda foi tão expressiva que empresas aéreas já reduziram o número de voos entre os dois países.
O boicote do Canadá foi encorajado pelo novo premiê, Mark Carney, por Trudeau e por governadores das províncias mais populosas. Supermercados passaram a destacar com rótulos produtos “made in Canada” e lojas de bebidas retiraram das prateleiras garrafas de vinho e uísque Bourbon americanos.
O sentimento antiamericano entre os canadenses cresceu depois do discurso de Trump ao Congresso no último dia 4. O sentimento anti-Trump é predominante, e em entrevistas nas ruas de Toronto, Montreal e Vancouver é frequente o público fazer a distinção entre o presidente e o povo americano. Mas uma pesquisa no final de fevereiro já mostrava que 27% dos canadenses hoje veem os EUA como um “Estado inimigo”.
Lá Fora
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O pacífico Canadá é objeto de piadas e descrito com clichês pelos monoglotas vizinhos do sul. Trudeau deixou claro que a ameaça de Trump é séria e que a intenção é prostrar a economia canadense. Mas parece que o presidente americano confunde afabilidade com fraqueza.
Os europeus, horrorizados com a demolição da ordem internacional do pós-guerra arquitetada por seu não mais aliado, debatem, nas redes sociais, a entrada do Canadá na União Europeia. A adesão seria tecnicamente impossível por motivos geográficos. Mas vale lembrar que Chipre, membro da UE e culturalmente europeu, é localizado na Ásia.
A linguagem agressiva de Trump tem feito do presidente um cabo eleitoral para os líderes liberais dos países que ele quer punir. Mas é no Canadá que ele provocou uma onda de nacionalismo sem precedentes.
Há 25 anos, um comercial da cerveja Molson explorou brilhantemente os clichês usados pelos americanos para descrever o Canadá. Neste mês, o mesmo ator usado no comercial da Molson se tornou protagonista de um remake para promover não a cerveja, mas o significado de ser canadense. Com o humor do país que mais exportou comediantes para os EUA, Jeff Douglas declara no vídeo: “Nós não somos o 51º coisa nenhuma.”
Fonte ==> Folha SP