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Bancos podem acessar mercado de US$ 4 tri com finanças mistas voltadas à sustentabilidade, aponta BCG | ESG

Santino Lacanna, sócio da consultoria BCG — Foto: BCG/ Divulgação

Quatro trilhões de dólares. Esta é a lacuna de financiamento anual para projetos e empresas que visam trabalhar nas metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas e que poderia ser preenchida com instrumentos financeiros mistos, parte filantropia e parte dinheiro reembolsável (o chamado blended finance). O número consta no relatório “O mercado financeiro misto: uma oportunidade de crescimento para os bancos construirem” (O Mercado de Financiamento Misto: Uma Oportunidade de Crescimento para os Bancos Construírem”, na tradução livre), elaborado pela consultoria Boston Consulting Group (BCG) e que analisa o papel das finanças mistas no financiamento de projetos de impacto socioambiental.

O relatório pontua que os bancos comerciais têm uma oportunidade significativa a ser explorada, especialmente nos setores de energia e infraestrutura. Apesar de o blended finance ser comumente relacionado a projetos de microcrédito, e, de fato, este é um segmento que pode se beneficiar da estrutura, há oportunidades em outros setores de infraestrutura e desenvolvimento de grande escala.

“Existe uma lacuna de financiamento anual de trilhões de dólares para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. E, dentro dessa lacuna, US$ 2,6 trilhões estão especificamente em energia e infraestrutura”, afirma Lacanna. O executivo também cita como exemplo os projetos de recuperação de pastagens degradadas, que, sozinhos, têm potencial de atrair US$ 50 bilhões.

As finanças mistas surgem como um caminho para destravar esse capital, especialmente ao unir investimentos privados com capital concessional (de origem pública ou filantrópica), que pode reduzir riscos e melhorar o perfil de retorno dos projetos sustentáveis.

Com esses instrumentos, os bancos comerciais conseguem, ao mesmo tempo, obter retornos financeiros e contribuir com o avanço da sustentabilidade. É, portanto, uma opção atraente para o capital comercial (privado), mobilizando investimentos em iniciativas de desenvolvimento sustentável.

Santino Lacanna, diretor executivo e sócio do BCG, explica que, atualmente, o mercado de finanças mistas é avaliado entre US$ 18 bilhões, de acordo com dados do Convergence, de 2024, e US$ 70 bilhões, segundo o cálculo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), de 2023.

O que torna uma atividade propícia a se beneficiar deste tipo de mecanismo de financiamento é a combinação de grande volume de capital necessário e alto risco. Geralmente, estes são os projetos mais inovadores e/ou que podem beneficiar populações e regiões que, de outra forma, teriam dificuldade em atrair investimento privado puro. “Eles exigem grandes volumes de capital, têm um impacto social e ambiental significativo e podem oferecer retornos financeiros atraentes quando o risco é mitigado de forma inteligente”, lembra.

Santino Lacanna, sócio da consultoria BCG — Foto: BCG/ Divulgação

No entanto, o executivo reitera que “a falta de definições compartilhadas, dados fragmentados e fatores variáveis” atrapalham o avanço do financiamento misto no Brasil, ao dificultar estimativas precisas. Entre os fatores variáveis estão a disponibilidade de capital catalítico, índices de alavancagem e solidez do pipeline. “Acreditamos que a verdadeira oportunidade é provavelmente muito maior e que ainda está em construção”, afirma Santino Lacanna, diretor executivo e sócio do BCG.

No entanto, a falta de definições compartilhadas, dados fragmentados e fatores variáveis – como disponibilidade de capital catalítico, índices de alavancagem e solidez do pipeline – dificultam estimativas precisas. Acreditamos que a verdadeira oportunidade é provavelmente muito maior e que ainda está em construção”, afirma Santino Lacanna, diretor executivo e sócio do BCG.

Em finanças, o termo “catalítico” refere-se a investimentos que buscam gerar um impacto socioambiental positivo, além de retornos financeiros. O investimento catalítico, concessional e não-reembolsável, são frequentemente utilizados para mitigar riscos percebidos ou reais, servindo como uma espécie de garantia. Portanto, é chamado assim (capital catalítico) porque é um recurso que age como um catalisador, atraindo investimentos adicionais – em geral, reembolsáveis – para ampliar seu alcance.

A análise mostra que, embora o crescimento desse ramo tenha sido limitado nos últimos anos, o cenário está mudando e as barreiras que antes o restringiam estão sendo superadas.

“Existe uma grande oportunidade emergente e promissora”, diz, reiterando que o estudo tem como objetivo mostrar o potencial e como os bancos podem atuar para moldar e capitalizar essa oportunidade. “Os resultados práticos estão sendo construídos à medida que mais atores entram e as estruturas se aprimoram.”

Além disso, mudanças recentes nos fluxos de capital e nas estratégias institucionais estão criando aberturas para a mobilização de financiamento privado. Com a projeção de que a ajuda ao desenvolvimento socioambiental deva cair entre US$ 50 bilhões e US$ 70 bilhões, os recursos não-reembolsáveis disponíveis devem ser usados mais como capital catalítico para atrair o setor financeiro e de investimento privado à equação.

A projeção do volume que o mercado de blended finance pode chegar varia conforme a fonte da estimativa – é de US$ 18 bilhões, pelo Convergence, e de US$ 70 bilhões, pela OCDE. Segundo Lacanna, essa variação nas estimativas reflete a complexidade e o potencial ainda não explorado do mercado.

Questionado sobre o que atrai o capital, seja ele concessional ou comercial, o executivo do BCG elenca alguns fatores-chave, sendo o primeiro deles a disponibilidade de capital catalítico, que é o capital “paciente” ou concessional, que assume a primeira perda ou mitiga riscos, tornando o projeto mais atraente para o capital comercial.

“Em segundo lugar, a força dos pipelines de projetos. Não basta ter capital, é preciso ter projetos bem estruturados e prontos para investimento”, conta.

Além disso, o crescimento desta modalidade também depende da disposição do setor privado em dedicar recursos para moldar o mercado. “Isso significa que o capital comercial não está apenas esperando projetos prontos, mas está ativamente buscando entender, adaptar e participar na estruturação.”

Lacanna ainda comenta que o que diminui o risco e cria a oportunidade é a combinação de ferramentas padronizadas, melhores termos de compartilhamento de risco e a evolução das estratégias dos doadores. “Tudo isso torna o financiamento misto mais prático e replicável”, afirma.

Por fim, lembra que a clareza nos papéis dos diferentes atores, uma orientação de risco bem definida e o treinamento das equipes de linha de frente também permitem que os bancos e outros investidores vejam além de transações isoladas, enxergando uma oportunidade de moldar um mercado crescente e de alto impacto. “É a convergência desses elementos que transforma o potencial em uma oportunidade de investimento real e atrativa”, resume.

Para Lacanna, diretor do BCG, o financiamento misto está entrando em uma nova fase de maturidade. “Esforços recentes têm se concentrado em torná-lo mais fácil de originar, estruturar e executar. Isso se deve, em grande parte, à padronização”, comenta o executivo, ao explicar que isso aumenta a escalabilidade dos projetos.

Além disso, cita que os Bancos Multilaterais de Desenvolvimento (MDBs) e as Instituições Financeiras de Desenvolvimento (DFIs), que são agentes importantes neste segmento de instrumentos financeiros, também estão aprimorando as garantias e os instrumentos de compartilhamento de risco. “Isso significa termos mais claros e um melhor alinhamento com as expectativas comerciais, o que é crucial para atrair o capital privado”, diz Lacanna.

Para o tema avançar, ele lembra que as instituições financeiras precisam ter uma visão mais precisa sobre as taxas de inadimplência e recuperação de crédito, o que pode diminuir a percepção de risco naturalmente. Contribuem para isto o avanço nas discussões regulatórias sobre como o capital concessional e as garantias, assim como ferramentas como o Banco de Dados Global de Risco de Mercados Emergentes (GEMs). “Tudo isso contribui para um ambiente mais prático e menos burocrático”, diz Lacanna.

Como destravar oportunidades em bancos comerciais

O BCG também dedicou uma parte do relatório para aconselhar bancos comerciais a como se envolver mais no tema de blended finance. Nomear um líder sênior para a área, responsável por tratar a área como um dos produtos principais da organização, é um primeiro passo. Este profissional também deve encabeçar um plano de risco e orientar sua equipe para identificar e originar negócios e fazer a articulação com parceiros externos.

“Os bancos já possuem algumas das ferramentas necessárias para viabilizar as finanças mistas, como experiência público-privada, capacidades em finanças estruturadas e de projetos e alcance global. Por isso, com os movimentos certos, essas instituições podem transformar a liderança inicial em vantagem de longo prazo”, conclui Lacanna.



Fonte ==> Exame

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