Mulheres são maioria nas igrejas evangélicas. O apoio delas ajudou Jair Bolsonaro a vencer a eleição em 2018. Mas, em vez de serem cortejadas, algumas vêm perdendo espaço de atuação em suas comunidades de fé, especialmente nas igrejas ricas. Por quê?
As denominações que mais regrediram no tema dos direitos das mulheres são as chamadas igrejas históricas, especialmente aquelas plantadas no Brasil por missionários norte-americanos. Destacam-se a Presbiteriana do Brasil, a Batista e a Adventista. São organizações influentes, com milhões de membros no país.
O exemplo mais contundente desse processo aconteceu em 2022. O Conselho Supremo da Igreja Presbiteriana proibiu mulheres de pregar em cultos. Sendo uma igreja rica, a decisão tensionou sua relação com mulheres com títulos universitários que, nas outras esferas da vida, têm os mesmos direitos e responsabilidades dos homens.
Entre 2018 e 2022, dois ministros de Bolsonaro, na Educação e na Justiça, foram dessa denominação, conhecida por valorizar a educação.
O debate acontece na chave da linguagem. Evangélicas não podem usar o termo “feminismo”, que é associado a pautas de esquerda, sendo classificado como satânico e demoníaco. Assim como o socialismo coloca em oposição ricos e pobres, a “luta de classes” do feminismo é entre homens e mulheres. A vítima, segundo essa lógica, é a família.
Em vez disso, fala-se teologicamente em “complementarismo”, em oposição ao “igualitarismo”. O primeiro argumenta que homens e mulheres têm papéis diferentes e complementares, sendo a mulher subordinada ao homem. O último defende que Deus criou ambos à sua imagem e semelhança; portanto, não há margem para a subordinação de um pelo outro.
Mesmo no caso de pastoras ordenadas, a expectativa é que elas sejam supervisionadas por um pastor. “Depois do culto, quando a pessoa passa para nos cumprimentar, o pastor é reverenciado por sua inteligência e autoridade. Comigo, o comentário tende a ser: ‘Que bonitinho, você aqui’”, me disse uma pastora, pedindo anonimato.
Outro tema polêmico: a mulher chamada para ocupar cargos é, geralmente, casada com um líder da igreja e, assim, mais submetida ao controle dele. “Quando a gente vai analisar o perfil delas, a que lidera é alguém mais tradicional”, diz outra interlocutora, também anonimamente. “Ficam fora mulheres divorciadas, as sem filhos e as mães solo.”
Aqui na Folha, tenho tido dificuldades para trazer evangélicas para escrever, dada a sensibilidade que envolve o tema. “Você vê hoje pastores sendo extremamente ofensivos com mulheres em redes sociais”, relatou uma terceira interlocutora, também sob anonimato. “A tensão política com a esquerda justifica essas atitudes. Às vezes, a mulher recebe ataques terríveis apenas por ser ordenada pastora.”
Quais são as consequências disso? Mulheres têm que escolher entre fingir subordinação ou perder sua rede de relacionamentos e solidariedade. A igreja se distancia da sociedade e desestimula a participação de jovens. Mas está em jogo sua infraestrutura e seu posicionamento para 2026.
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Fonte ==> Folha SP