O consumidor sente no bolso: os alimentos estão mais caros. Entre janeiro de 2020 e meados de 2024, os preços da comida subiram quase 50% no Brasil, enquanto a inflação geral acumulou 31%. Em dezembro de 2020, a inflação anual de alimentos atingiu impressionantes 18%. Um fenômeno global: nos EUA, os preços subiram 11% em 2022, maior alta desde 1980. Na Europa, a inflação alimentar alcançou 15% no mesmo período.
Mas um fato tem passado desapercebido durante essa escalada de preços: o aumento das fraudes alimentares.
Fraude alimentar é qualquer adulteração intencional para ganho econômico. Seu motor é puramente financeiro —quando ingredientes encarecem, aumenta o incentivo para substituí-los por alternativas mais baratas.
No Brasil, os exemplos são concretos e recentes. O azeite, item que disparou em preço recentemente, lidera as fraudes: entre 2023 e 2024, 12 marcas brasileiras foram banidas após confirmação de falsificação. Na Europa, apenas no primeiro trimestre do ano passado, registrou-se o maior número de casos de adulteração de azeite da história. Em 2023, o Ministério da Agricultura detectou adulteração em 14,4% das marcas de mel analisadas. Produtores adicionavam açúcar ou xarope de milho ao produto puro para diluí-lo e reduzir custos.
Outro caso emblemático envolveu a “fraude da manteiga” —produtos vendidos como manteiga pura continham óleo vegetal barato. Já o requeijão ganhou amido não declarado para aumentar o volume.
A explicação econômica é simples: quando o preço do alimento legítimo aumenta, a diferença entre o custo do produto verdadeiro e o falsificado amplia-se. Isso eleva o potencial de lucro para fraudadores.
Simultaneamente, o consumidor pressionado pela inflação busca alternativas mais baratas, tornando-se vulnerável a ofertas aparentemente vantajosas. Essa combinação cria o ambiente perfeito para a multiplicação de fraudes.
Períodos inflacionários também testam a capacidade dos órgãos fiscalizadores. Com múltiplas crises simultaneamente, a vigilância pode ficar sobrecarregada, abrindo brechas para novos ilícitos.
A cadeia global de alimentos, complexa e fragmentada, apresenta pontos vulneráveis. Quando há choques de preços ou escassez, esses elos frágeis são explorados por fornecedores desonestos.
Para investidores e empresas do setor alimentício, o recado é claro: períodos de alta inflação exigem vigilância redobrada com fornecedores e matérias-primas. O risco reputacional de ser associado a produtos fraudados pode superar qualquer economia de curto prazo.
O consumidor, por sua vez, deve desconfiar de preços muito abaixo do mercado, especialmente em itens que sofreram aumentos significativos como azeite, mel e carnes. A fraude alimentar custa à indústria entre US$ 30 bilhões e US$ 40 bilhões anuais globalmente. Enquanto os preços continuarem pressionados, esse número tende a crescer. É hora de investir em prevenção.
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Fonte ==> Folha SP