Exuberante, comovente, ousado, surpreendente. Podemos dizer que “Homem com H”, a cinebiografia de Ney Matogrosso estrelada por Jesuíta Barbosa, tem a mesma personalidade do seu retratado.
O filme passa por todos os momentos importantes da vida de Ney, da repressão do pai na infância à relação com Cazuza, sem se esquivar de nada. A montagem primorosa pega o espectador pela mão na primeira cena e não solta mais, exatamente como Ney faz em seus shows.
“Este filme tem toda a minha vida contada sem pudor nenhum. Não cabia pudor numa obra como essa”, disse Ney, em encontro com a imprensa na tarde desta quarta-feira (23). O cantor contou que deu total liberdade criativa ao diretor Esmir Filho, inclusive na escolha das músicas.
Os fãs são presenteados com muitos hits, do forró que dá nome ao filme a “Sangue Latino”, “Rosa de Hiroshima”, “Pro Dia Nascer Feliz” e algumas outras –a voz do cantor está lá, dublada por Jesuíta nesses momentos.
Jesuíta, ator de longa experiência no cinema, em filmes como “Tatuagem” e “Praia do Futuro”, conta que passou muitas horas na casa de Ney no Rio de Janeiro, observando os objetos ao seu redor. “Eu percebia ele me observando o tempo todo”, brinca Ney.
Para Jesuíta, o trabalho de interpretação de um dos maiores ícones da MPB envolvia “um enigma, um mistério”. “Eu precisei dar conta de uma figura, um bicho, um animal possível, mas com a razão que a história pedia”, descreve.
O ator, que já é magro, perdeu mais 12 quilos para se aproximar da figura do cantor desde os anos 70, quando integrou o Secos e Molhados. Foram três meses de preparação de corpo, voz e canto. Um dos desafios foi encontrar o gestual de Ney. “A minha movimentação é mais ‘staccata’ [rígida], a do Ney é muito mais arredondada”.
SOLTANDO OS BICHOS
O diretor Esmir Filho, que ficou conhecido em 2006 pelo curta “Tapa na Pantera”, hit no YouTube, e pela série “Boca a Boca”, da Netflix, começou o projeto ainda em 2021, na pandemia, ouvindo todas as músicas de Ney em ordem cronológica.
O diretor contou com o que chama de “uma memória precisa” do artista sobre todos os eventos de sua vida, e de uma pesquisa aprofundada de todos figurinos preservados de Ney. “Tem uma frase que resume muito o espírito do Ney: ‘Eu sempre reagi ao autoritarismo’. Ele sempre lutou contra as autoridades que tentaram reprimi-lo, botá-lo numa caixinha”.
Juntos, Esmir e Ney decidiram já nas filmagens mudar o final do longa. O desfecho original mostraria Ney em meio às matas do seu sítio soltando bichos silvestres, como jiboias e porcos-do-mato, algo que ele costuma fazer. “Mas chegamos à conclusão de que eu ainda não estou aposentado”, contou o cantor. O novo final inclui um show da grande turnê “Bloco na Rua”, do ano passado.
Além de fazer jus à grandeza de Ney com um filme colorido e ao mesmo tempo forte e delicado, Esmir Filho ainda saldou uma grande dívida deixada por “Cazuza: O Tempo Não Para” (2004): retratar com profundidade a relação intensa de Ney e Cazuza, que terminou pelos excessos de drogas e álcool do segundo, mas cujo carinho perdurou até a morte do autor de “O Tempo Não Para” em 1990.
Entre outros tantos méritos, “Homem com H” também não se esquiva de abordar a devastação da epidemia de Aids na vida de Ney e dos amigos à sua volta. Mais do que um filme para fãs, é uma declaração de amor a um dos artistas mais livres do nosso país.
“Homem com H”
Estreia na quinta 1º/5 nos cinemas
Pré-estreias na quarta, 30/4
Fonte ==> Folha SP