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O efeito político da esquecida economia – 16/08/2025 – Vinicius Torres Freire

Na imagem, duas pessoas estão se cumprimentando com um aperto de mão. À esquerda, um homem de cabelo grisalho e liso, vestindo um terno escuro com uma gravata vermelha. À direita, um homem mais velho, com cabelo grisalho e barba, usando um terno azul e uma gravata com padrões. O fundo é de madeira clara, sugerindo um ambiente formal.

O processo de Jair Bolsonaro e seus desdobramentos, como o tarifaço, abafaram a conversa política da primeira metade do ano. Também se presta ainda menos atenção à economia e seu efeito sobre o prestígio presidencial e o Congresso. Inflação, gasto público (com emendas inclusive) e um início de desaquecimento do PIB merecem atenção.

O primeiro semestre foi de vazio de decisões no Congresso, travado também por negociação de emendas. Terminou com a querela do IOF, outra revolta contra impostos, que encurralava o governo e será tema eleitoral de 2026.

No primeiro trimestre, atormentado pela baixa na popularidade e pela inflação de alimentos, que passara de 8% ao ano em 2024, o governo prometia providências. Em março, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizia procurar o “pilantra” da carestia do ovo. Não achou.

A falação e as poucas medidas deram em nada. O grosso da inflação da comida derivava de problemas mundiais, dificuldades incontornáveis no curto prazo em certos produtos (carne, café etc.) e do dólar caro, em parte por causa da lambança fiscal.

A carestia da comida (“alimentação no domicílio”, para o IBGE) ainda anda a 7,1% ao ano. Não seria ritmo crítico não fosse o efeito da grande inflação que apareceu no final da epidemia, o que ajudou a eleger Donald Trump.

Nos últimos seis anos, o salário médio nominal no Brasil cresceu 53,2%, além dos 40,2% do IPCA. Mas a inflação da comida aumentou 68,1%. O alívio relativo de meados de 2023 a meados de 2024 passou, o povo miúdo voltou a passar mal.

A baixa mundial do dólar ajudou a acalmar mercados e a atenuar a inflação média, com a contribuição de preços de commodities e bens industriais comportados. As taxas de juros de prazo além de dois anos estão no rumo de baixa desde fevereiro, no mercado.

Ainda assim, a taxa real de um ano está perto de 9,5% ao ano. Era de 6% em março de 2024 (antes da lambança da mudança da meta fiscal) e de 8% em outubro de 2024 (antes da lambança do pacote fiscal). O crédito bancário encarece, cresce menos e há mais inadimplência.

A economia desacelerou no segundo trimestre: queda de 1,7% no comércio, estagnação na indústria, alta de 1,1% nos serviços. Parecem números compatíveis com um crescimento do PIB que passaria do 3,4% de 2024 para perto de 2,3% neste ano.

O desaquecimento mal afeta o mundo de emprego e salário —em geral, essa mudança aparece mais tarde no ciclo econômico, talvez em 2026. Por outro lado, um aumento da execução orçamentária neste resto de 2025 daria algum gás à atividade econômica.

O gasto federal no primeiro semestre aumentou 2,4%, em termos reais (ante a primeira metade de 2024). No ano passado, crescera 10,5%. A aprovação tardia do Orçamento, o parcelamento mais rigoroso do gasto ao longo do ano, a postergação do pagamento de precatórios e o temor de receita menor pesaram na execução da despesa que o governo ainda controla (discricionária). Foi o caso em saúde e educação, Bolsa Família (por revisões), investimento e, por tabela, em emendas.

Além da pressão do STF para limitar a mutreta, menos dinheiro para emendas explica em parte revoltas no Congresso. O outro assunto parlamentar central é a mudança de foro de julgamento. Emendas, a tentativa de fugir da Justiça, regulação de “big techs” e, claro, a insurreição permanente dos golpistas dominam o cenário.

Em resumo, conviria não esquecer o efeito político do ruído de fundo da economia.



Fonte ==> Folha SP

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