O fóssil de um pequeno réptil que habitou a Escócia durante a Era dos Dinossauros há 167 milhões de anos tem intrigado cientistas. Ele combinava características de cobra e de lagarto. Então, seria um ancestral primitivo das cobras ou talvez apenas uma anomalia evolutiva? Qualquer que seja a resposta, era uma pequena criatura formidável.
Pesquisadores afirmaram que a criatura, batizada de Breugnathair elgolensis, possuía dentes curvados e em forma de gancho, como nas cobras. E a maneira como seus dentes estavam implantados em suas mandíbulas e o ângulo de inclinação para dentro em relação às mandíbulas também eram semelhantes aos das cobras. Mas as proporções de seu corpo e cabeça eram mais parecidas com as de lagartos, incluindo seus membros bem desenvolvidos.
O Breugnathair, que teria cerca de 30 centímetros de comprimento incluindo sua cauda, vivia em um ambiente semelhante a um manguezal com condições tropicais durante o Período Jurássico –muito mais quente do que a Escócia atual. O espécime pode ter se alimentado de insetos, pequenos mamíferos, anfíbios e outros lagartos.
Esse representa um dos fósseis relativamente completos mais antigos da ordem que abrange lagartos e serpentes, os escamados. Com seu mosaico de características, Breugnathair borrou a linha entre um lagarto e uma serpente.
“Ou é um ancestral semelhante a um lagarto das serpentes, ou pertence a um grupo mais primitivo de lagartos que evoluiu independentemente características semelhantes às de serpentes relacionadas a uma dieta predatória. O equilíbrio de evidências é tão estreito que não conseguimos escolher entre essas duas alternativas”, disse o paleontólogo Roger Benson, do Museu Americano de História Natural em Nova York (Estados Unidos), autor principal do estudo publicado no último dia 1º na revista Nature.
“A combinação inesperada de características que estamos vendo mostra que a evolução inicial dessa ordem foi muito complexa, e estamos apenas começando a entender o que pode ter acontecido”, acrescentou Benson.
As cobras mais antigas conhecidas indiscutivelmente no registro fóssil datam de aproximadamente 110 milhões de anos atrás, durante o Período Cretáceo, de acordo com a colíder do estudo Susan Evans, paleontóloga e morfologista evolutiva da University College London (Reino Unido).
“Ninguém as confundiria com qualquer outra coisa. Elas têm corpos longos, não possuem nenhum vestígio de membros anteriores e têm membros posteriores reduzidos”, disse Evans.
No entanto, esses fósseis não revelam como eram as cobras antes de evoluírem para seus característicos corpos alongados.
“Então, não sabemos, por exemplo, se as cobras evoluíram primeiro suas características distintivas de cabeça e mandíbula, ou primeiro seus corpos longos, semelhantes a serpentes. E não sabemos onde as cobras evoluíram pela primeira vez, ou sua ecologia”, afirmou Benson.
Embora seja possível que Breugnathair tenha sido uma forma transicional inicial entre lagartos e serpentes, sua anatomia é desconcertante.
“Sabemos pelo DNA que as serpentes estão relacionadas a iguanas e a alguns grupos de lagartos. Portanto, esperamos que o ancestral das serpentes seja semelhante a um lagarto e compartilhe características com esses grupos”, disse Benson.
“Mas, quando observamos os detalhes do Breugnathair, não vemos muitas características compartilhadas com esses grupos. Em vez disso, ele possui algumas características mais primitivas compartilhadas com alguns dos lagartos mais antigos e presentes hoje em algumas espécies. Isso é uma grande surpresa”, acrescentou Benson.
Descoberto na ilha de Skye em uma localidade costeira próxima à cidade de Elgol, seu nome científico significa “falsa serpente de Elgol”.
Se não fazia parte da linhagem das serpentes, o Breugnathair pode ter sido um beco sem saída evolutivo, com hábitos predatórios parecidos com os das serpentes, surgindo separadamente em um grupo que acabou por se extinguir, de acordo com os pesquisadores.
Os primeiros répteis apareceram há cerca de 320 milhões de anos, segundo Benson. Algumas das formas mais antigas eram superficialmente semelhantes aos lagartos, mas careciam das características distintivas dos escamados, como vários traços que aumentam a mobilidade entre os ossos do crânio em relação à alimentação, e características dos ombros que aumentam o comprimento do passo nos lagartos.
O Breugnathair levanta tantas questões quanto responde. “Ele pode nos ajudar, em última análise, a entender quais características devemos procurar em fósseis futuros para compreender a ancestralidade das serpentes”, disse Evans.
Fonte ==> Folha SP – TEC