Search
Close this search box.
Search
Close this search box.

Um curso de micro-habilidades – 15/04/2025 – Claudio Manoel

Um curso de micro-habilidades - 15/04/2025 - Claudio Manoel

Recebi um e-mail nesta semana com o seguinte título: “Domine as micro-habilidades e transforme sua vida”. Embora curioso, não cliquei, porque fiquei em dúvida se era mais um golpe virtual ou apenas uma tradicional picaretagem raiz.

Poucas horas depois, como os algoritmos são bastante unidos e se conversam muito, apareceu, novamente, numa das redes (não lembro se no Instagrana ou no Linkedindin), o anúncio de um curso com o mesmo tema.

Sem ter nada melhor para fazer, não tive opção a não ser especular: que diabos seriam as tais “micro-habilidades”? Seria ser bom em fazer coisas micro? Como escrever o Pai-Nosso na cabeça de um alfinete, ou vestir de noiva e noivo um casal de pulgas?

Antes de dar mais asas à minha ignorância, me lembrei de quando, há alguns anos, deparei com um outro conceito fashion, de outra coisa micro que estava em alta na época: as microagressões. Por algum tempo pensei que falavam de algo tipo peteleco na orelha, botar chiclete no cabelo ou xingar de cabeça de mamão.

Só depois é que aprendi que o assunto era sério, ou fazia a maior força para ser. Tratava-se de denunciar aqueles comentários “sutis”, geralmente disfarçados de elogio, que vem com uma carga de preconceito ou maldade embutida.

E me deram logo um exemplo: “Nossa, você está tão bem para sua idade”. Claro que percebi que a frase era um “chamar de velho” disfarçado, mas argumentei que ainda era melhor que os muito mais macros e sem nenhum disfarce: “Tá acabado, véio!”, ou “Tá ficando gagá, coroa?”.

Embora tenha muita coisa que não é tão micro assim, tais como: “Engraçado, teu filho nem parece que é gay!”, “Legal essa sua autoestima mesmo tendo engordado tanto”, “Você é só mãe ou faz mais alguma coisa?”, “Admiro demais seu otimismo, mesmo sua vida sendo assim”, ou “Você é japonês mesmo? Então me diz qual é a raiz quadrada de 225”, entre outras pérolas mais impublicáveis.

Para não repetir o mesmo erro e tentar novas formas de errar, resolvi pesquisar sobre as tais micro-habilidades antes de continuar a falar besteira.

E não é que o negócio é sério? Quer dizer, “sério” no padrão 2025. Os cursos vão desde “Como dizer não sem culpa” (e sem gaguejar?), “Escuta ativa: pare de interromper os outros com histórias suas” (e muito menos falar “comigo foi pior”, suponho) até o meu preferido: “Gestão de emoções”.

Tudo com certificado digital, aulas online e depoimentos de ex-interruptores desconstruídos, novos negadores bem-sucedidos e “emotions managers” especializados (não imagino em quê).

A ideia, segundo os idealizadores e entusiastas, é que a gente precisa reaprender coisas básicas da convivência, aquilo que meus pais e vossos avós chamavam de “ter educação”, mas que agora vem embalado em workshops, tutoriais, apresentados e vendidos por coachs ou influenciadores digitais.

Sabe aquele velho dito popular “Todo dia um malandro e um otário saem de casa. Quando eles se encontram, sai negócio”?

A coisa melhorou muito, agora nem o malandro nem o otário precisam mais sair de casa.



Fonte ==> Folha SP

Relacionados